O afrocentrismo nasce como resposta direta à dominação , espiritual e política que o eurocentrismo impôs ao longo de séculos. Nat Turner, Marcus Garvey e Malcolm X são três vozes que, em tempos e contextos diferentes, apontaram para a mesma verdade: o africano só será livre quando voltar a ser o centro da sua própria história.
Nat Turner, em 1831, liderou uma insurreição escrava que abalou os alicerces do sistema escravocrata nos Estados Unidos. Ele relatava: “Tive uma visão e vi espíritos brancos e negros em batalha… e ouvi uma voz dizendo: tu deves suportar isto.” Essa frase mostra que, para Turner, a luta não era apenas contra correntes físicas, mas também contra correntes espirituais e psicológicas. Ele percebia que havia uma guerra de narrativas, uma guerra invisível que tentava convencer o negro de que era incapaz de lutar. Turner também lembrava como aprender a ler e a escrever, ainda que às escondidas, mudou completamente sua mente. Isso revela que a educação e o conhecimento são instrumentos centrais de libertação, e que o eurocentrismo sempre buscou controlar a leitura e a escrita para manter o africano em silêncio.
Marcus Garvey, no início do século XX, transformou esse espírito em movimento político e cultural. Ele dizia: “Se acreditas que o negro tem alma, então deves admitir que o que outros homens fizeram, os negros também podem fazer. Queremos construir cidades, nações, governos, indústrias nossas em África.” Garvey defendia que não bastava resistir à opressão, era preciso reconstruir a grandeza africana. O seu lema “África para os africanos, em casa e no estrangeiro” continua atual, pois ainda hoje muitos africanos vivem em diásporas forçadas, em países que os tratam como cidadãos de segunda. O afrocentrismo, segundo Garvey, é o caminho para a dignidade plena, para um futuro onde os africanos sejam protagonistas da sua própria história.
Malcolm X, por sua vez, denunciou de forma radical a manipulação da mente através da educação eurocêntrica. Ele dizia: “A educação é um elemento essencial na luta pelos direitos humanos. É o meio de ajudar nosso povo a redescobrir sua identidade e, assim, aumentar o respeito por si mesmo.” Também lembrava: “A educação é o nosso passaporte para o futuro, pois o amanhã pertence àqueles que se preparam hoje.” Malcolm mostrava que as escolas e universidades moldadas pelo eurocentrismo ensinavam o negro a rejeitar a sua pele, a desprezar a sua história e a adorar o opressor. O afrocentrismo, ao contrário, é uma pedagogia da libertação, porque coloca a criança africana em contacto com os feitos de seus antepassados, com os impérios, filosofias e culturas que existiram antes da colonização.
O eurocentrismo, por outro lado, construiu uma narrativa global que sempre colocou a Europa como centro de tudo. Ele apresentou os africanos como “descobertos”, “conquistados” ou “civilizados”, nunca como criadores de civilizações próprias. Essa visão justificou a escravatura, a colonização e ainda hoje sustenta estruturas de exploração económica e cultural. Mesmo em currículos atuais, vemos reis europeus exaltados, enquanto impérios africanos como Mali, Songhai, Kush ou Axum são reduzidos a notas de rodapé. O eurocentrismo ensina o africano a acreditar que não tem raízes, que só existe através da lente europeia.
Por isso, é fundamental desconfiar dos “ditos sábios” que se apresentam como neutros, mas continuam a repetir o discurso colonial. Muitos intelectuais falam de progresso e ciência, mas escondem que o saber deles está moldado por séculos de exclusão. O verdadeiro sábio é aquele que reconstrói pontes com os ancestrais, que devolve ao povo a consciência da sua história e a força de sua espiritualidade.
O afrocentrismo não exclui ninguém: ele não é ódio ao outro, mas amor a si mesmo. Ele busca reconectar o africano com a sua essência, restaurar a autoestima perdida e replantar raízes arrancadas pelo colonialismo. Enquanto o eurocentrismo tenta apagar, o afrocentrismo reacende a chama. Enquanto o eurocentrismo ensina a obediência, o afrocentrismo desperta a liberdade. É essa a lição de Turner, Garvey e Malcolm X: que o negro só será livre quando compreender que a sua história, a sua pele e a sua alma são a base de um futuro digno e soberano.
Afrocentrismo vs Eurocentrismo
